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Bruno Varela, cineasta etno-experimental

II módulo: Bruno Varela, cineasta etno-experimental
Sexta-feira, 24 de Novembro, 18h
Projecção seguida de uma conversa presencial com Bruno Varela, moderada por Raquel Schefer.
Projecção dos filmes El Monolito, México, 2019, 40’ e El Prototipo, México, 2022, 63’.

Sábado, 25 de Novembro, 18h
Atelier de fitogramas (fotografia analógica sem câmara com materiais orgânicos vegetais) coordenado por Bruno Varela.
Actividade gratuita aberta ao público com inscrição prévia através de formulário disponível no site do Hangar.
Limite máximo de 15 participantes.

Uma das figuras mais importantes e singulares do cinema experimental contemporâneo, o cineasta e videoartista mexicano Bruno Varela inicia a sua carreira em 1992 em Oaxaca, no quadro do projecto de vídeo comunitário indígena Ojo de Agua Comunicación, e, mais tarde, em Chiapas, no Yucatán e na Bolívia, onde forma em vídeo comunicadores autóctones. A praxis cinematográfica de Varela, definida pelo cineasta como uma “retroguarda”, articula procedimentos formais do cinema experimental, como o reemprego polifónico de imagens-sons de arquivo, com elementos culturais autóctones, através dos quais se tornam sensíveis, sobre o pano de fundo do contexto histórico-político mexicano, cosmovisões e cosmologias adjacentes. Em El Monolito (2019), média-metragem que será apresentada no Hangar, Varela toma como ponto de partida Un amour d’UIQ, guião de ficção científica de Félix Guattari. Em 1980, o psicanalista e filósofo francês começa a escrever, em colaboração com o cineasta norte-americano Robert Kramer, o guião deste projecto cinematográfico inacabado que procura, segundo Silvia Maglioni, “oferecer um modelo de cinema ‘popular’ subversivo e desejante”. Varela transpõe o projecto de Guattari e Kramer para o contexto da Revolta de Oaxaca de 2006, um dos mais importantes levantamentos populares dos anos 2000 no México. Para tal, o cineasta reemprega materiais de arquivo que filmou durante a insurreição, desenvolvendo formas visuais e sonoras de montagem que se inscrevem, tal como o trabalho de Kramer com o Colectivo Newsreel — e, mais tarde, em Portugal (veja-se a longa-metragem Scenes from the Class Struggle in Portugal, 1977-79) —, na genealogia do newsreel experimental e que contribuem para a sua desestruturação formal e epistemológica. Se a câmara de Varela restitui a espessura sensível do acontecimento político na sua temporalidade dinâmica, a montagem deste “an-arquivo”, ao operar sobre um princípio de indeterminação de género, põe em crise o sistema eidético do cinema documental e a relação convencional entre a representação do real e a sua efabulação. Os agenciamentos colectivos de enunciação, através das múltiplas instâncias discursivas do filme, criam um complexo jogo de pontos de vista e apontam para a possibilidade de uma figuração não-fenomenológica da perspectiva desantropocêntrica do Universo Infra-Quark do guião de Guattari. El Prototipo, “filme especulativo” de 2022 que também será projectado no Hangar, radicaliza os pressupostos e procedimentos formais e epistemológicos de El Monolito. Transposição cinematográfica de outro texto de ficção cientifica — o romance Valis (1981), de Philip K. Dick —, El Prototipo “entrança”, verbo utilizado no seu intertítulo final, materiais de arquivo heteróclitos e intermediáticos, explorando, através do princípio de “opera aperta”, tanto os nós, quanto as fissuras do tecido fílmico e agenciando pontos de vista que desestruturam o binarismo sujeito-objecto. A câmara móvel e táctil, roçante e recolectora, ritualiza o proprio processo de representação cinematográfica, questionando o sistema disciplinar da etnografia. Os filmes de Varela, assentes numa política materialista dos modos de produção, são exibidos pela primeira vez em Portugal.

El Monolito, Bruno Varela, México, 2019, 40’
Sinopse
“O monolito é habitado por uma entidade minúscula, um universo consciente, um deus ou uma das suas formas. Na sua tentativa de ressonância com o humano, só logra avivar o fogo. Tudo arde para preparar a nova semeadura. Filme-obra negra, materiais de baixa resolução, intensidade, fluxos, corpos afectados e corpos afectando outros corpos. A revolta é um estado de presente, expansivo. Uma longa-metragem curta, uma curta-metragem longa. Arquivos de Oaxaca em 2006, premonições, sonhos de máquinas induzidas, sinais emanados a partir do espaço profundo. O fogo no presente, como uma antecipação do momento.

Apropriação livre de uma premissa de Félix Guattari, declaração de amor incendiária e extra- terrestre. Um cartaz formidável e excelentes fotogramas. Um filme fracassado na sua temporalidade, um filme ainda por vir.”

(Bruno Varela)

El Prototipo, Bruno Varela, México, 2022, 63’
Sinopse
“Uma entidade mutável enviada de outro tempo. Um ser audiovisual quase consciente, dotado de vontade, enviado de um qualquer futuro, ou de muito longe. O tempo é um simulacro, um artefacto, é possível entrar e sair do seu fluxo através de outras geometrias.

Através de perímetros sugeridos no romance Valis, de Philip K. Dick, o Protótipo é a manifestação de uma inteligência superior, inscrita em película de 16 mm perdida pela passagem de décadas e encontrada num mercado de antiguidades. Contém um sinal da fonte primordial. O motor do projecto activa-se na possibilidade de conceber um filme como um ser volátil que se re-organiza frente a cada espectador. Que é diferente em cada projecção e que caminha para a sua auto-destruição material”.

(Bruno Varela)

Bruno Varela
“Bruno Varela (Cidade do México, 1971). Artista audiovisual formado pela Universidade Autónoma Metropolitana em Comunicação Social. Desde 1992, dedica-se a tempo inteiro à investigação-produção de cinema e vídeo. O seu processo tem sido desenvolvido essencialmente no Sul geográfico e conceptual do continente, entre Oaxaca, Chiapas, Yucatán e a Bolívia. O seu trabalho tem sido apresentado em múltiplos fóruns, exposições e e festivais no México e no estrangeiro, tais como o Guggenheim NY, o Getty Research Institute LA, o Redcat Center for Contemporary Arts LA, a Bienal de Havana, o Centro de Arte Reina Sofía, a Bienal de la Imagen en Movimiento, o Festival Internacional de Oberhausen ou o Ann Arbor Film Festival. Recebeu prémios e menções honrosas em vários festivais, como o Prémio E–flux do Festival de Oberhausen (2015). Recebeu a distinção Media Artist da Fundação Rockfeller em 2006.”
(Bruno Varela)

Raquel Schefer
Raquel Schefer é investigadora, realizadora, programadora e Professora Associada na Universidade Sorbonne Nouvelle, onde concluiu o seu doutoramento em Estudos Cinematográficos em 2015. Publicou a obra El Autorretrato en el Documental. Foi bolseira de pós-doutoramento da FCT no CEC/Universidade de Lisboa, no IHC/Universidade Nova de Lisboa e na Universidade do Western Cape. É co-editora da revista de teoria e história do cinema La Furia Umana e conselheira de programação do International Film Festival Rotterdam (IDFA). No Hangar — Centro de Investigação Artística, programou, entre outros eventos, o ciclo Seeing Being Seen: Territórios, Fronteiras, Circulações (2020-2022).

II módulo: Bruno Varela, cineasta etno-experimental
Sexta-feira, 24 de Novembro, 18h
Projecção seguida de uma conversa presencial com Bruno Varela, moderada por Raquel Schefer.
Projecção dos filmes El Monolito, México, 2019, 40’ e El Prototipo, México, 2022, 63’.

Sábado, 25 de Novembro, 18h
Atelier de fitogramas (fotografia analógica sem câmara com materiais orgânicos vegetais) coordenado por Bruno Varela.
Actividade gratuita aberta ao público com inscrição prévia através de formulário disponível no site do Hangar.
Limite máximo de 15 participantes.

Uma das figuras mais importantes e singulares do cinema experimental contemporâneo, o cineasta e videoartista mexicano Bruno Varela inicia a sua carreira em 1992 em Oaxaca, no quadro do projecto de vídeo comunitário indígena Ojo de Agua Comunicación, e, mais tarde, em Chiapas, no Yucatán e na Bolívia, onde forma em vídeo comunicadores autóctones. A praxis cinematográfica de Varela, definida pelo cineasta como uma “retroguarda”, articula procedimentos formais do cinema experimental, como o reemprego polifónico de imagens-sons de arquivo, com elementos culturais autóctones, através dos quais se tornam sensíveis, sobre o pano de fundo do contexto histórico-político mexicano, cosmovisões e cosmologias adjacentes. Em El Monolito (2019), média-metragem que será apresentada no Hangar, Varela toma como ponto de partida Un amour d’UIQ, guião de ficção científica de Félix Guattari. Em 1980, o psicanalista e filósofo francês começa a escrever, em colaboração com o cineasta norte-americano Robert Kramer, o guião deste projecto cinematográfico inacabado que procura, segundo Silvia Maglioni, “oferecer um modelo de cinema ‘popular’ subversivo e desejante”. Varela transpõe o projecto de Guattari e Kramer para o contexto da Revolta de Oaxaca de 2006, um dos mais importantes levantamentos populares dos anos 2000 no México. Para tal, o cineasta reemprega materiais de arquivo que filmou durante a insurreição, desenvolvendo formas visuais e sonoras de montagem que se inscrevem, tal como o trabalho de Kramer com o Colectivo Newsreel — e, mais tarde, em Portugal (veja-se a longa-metragem Scenes from the Class Struggle in Portugal, 1977-79) —, na genealogia do newsreel experimental e que contribuem para a sua desestruturação formal e epistemológica. Se a câmara de Varela restitui a espessura sensível do acontecimento político na sua temporalidade dinâmica, a montagem deste “an-arquivo”, ao operar sobre um princípio de indeterminação de género, põe em crise o sistema eidético do cinema documental e a relação convencional entre a representação do real e a sua efabulação. Os agenciamentos colectivos de enunciação, através das múltiplas instâncias discursivas do filme, criam um complexo jogo de pontos de vista e apontam para a possibilidade de uma figuração não-fenomenológica da perspectiva desantropocêntrica do Universo Infra-Quark do guião de Guattari. El Prototipo, “filme especulativo” de 2022 que também será projectado no Hangar, radicaliza os pressupostos e procedimentos formais e epistemológicos de El Monolito. Transposição cinematográfica de outro texto de ficção cientifica — o romance Valis (1981), de Philip K. Dick —, El Prototipo “entrança”, verbo utilizado no seu intertítulo final, materiais de arquivo heteróclitos e intermediáticos, explorando, através do princípio de “opera aperta”, tanto os nós, quanto as fissuras do tecido fílmico e agenciando pontos de vista que desestruturam o binarismo sujeito-objecto. A câmara móvel e táctil, roçante e recolectora, ritualiza o proprio processo de representação cinematográfica, questionando o sistema disciplinar da etnografia. Os filmes de Varela, assentes numa política materialista dos modos de produção, são exibidos pela primeira vez em Portugal.

El Monolito, Bruno Varela, México, 2019, 40’
Sinopse
“O monolito é habitado por uma entidade minúscula, um universo consciente, um deus ou uma das suas formas. Na sua tentativa de ressonância com o humano, só logra avivar o fogo. Tudo arde para preparar a nova semeadura. Filme-obra negra, materiais de baixa resolução, intensidade, fluxos, corpos afectados e corpos afectando outros corpos. A revolta é um estado de presente, expansivo. Uma longa-metragem curta, uma curta-metragem longa. Arquivos de Oaxaca em 2006, premonições, sonhos de máquinas induzidas, sinais emanados a partir do espaço profundo. O fogo no presente, como uma antecipação do momento.

Apropriação livre de uma premissa de Félix Guattari, declaração de amor incendiária e extra- terrestre. Um cartaz formidável e excelentes fotogramas. Um filme fracassado na sua temporalidade, um filme ainda por vir.”

(Bruno Varela)

El Prototipo, Bruno Varela, México, 2022, 63’
Sinopse
“Uma entidade mutável enviada de outro tempo. Um ser audiovisual quase consciente, dotado de vontade, enviado de um qualquer futuro, ou de muito longe. O tempo é um simulacro, um artefacto, é possível entrar e sair do seu fluxo através de outras geometrias.

Através de perímetros sugeridos no romance Valis, de Philip K. Dick, o Protótipo é a manifestação de uma inteligência superior, inscrita em película de 16 mm perdida pela passagem de décadas e encontrada num mercado de antiguidades. Contém um sinal da fonte primordial. O motor do projecto activa-se na possibilidade de conceber um filme como um ser volátil que se re-organiza frente a cada espectador. Que é diferente em cada projecção e que caminha para a sua auto-destruição material”.

(Bruno Varela)

Bruno Varela
“Bruno Varela (Cidade do México, 1971). Artista audiovisual formado pela Universidade Autónoma Metropolitana em Comunicação Social. Desde 1992, dedica-se a tempo inteiro à investigação-produção de cinema e vídeo. O seu processo tem sido desenvolvido essencialmente no Sul geográfico e conceptual do continente, entre Oaxaca, Chiapas, Yucatán e a Bolívia. O seu trabalho tem sido apresentado em múltiplos fóruns, exposições e e festivais no México e no estrangeiro, tais como o Guggenheim NY, o Getty Research Institute LA, o Redcat Center for Contemporary Arts LA, a Bienal de Havana, o Centro de Arte Reina Sofía, a Bienal de la Imagen en Movimiento, o Festival Internacional de Oberhausen ou o Ann Arbor Film Festival. Recebeu prémios e menções honrosas em vários festivais, como o Prémio E–flux do Festival de Oberhausen (2015). Recebeu a distinção Media Artist da Fundação Rockfeller em 2006.”
(Bruno Varela)

Raquel Schefer
Raquel Schefer é investigadora, realizadora, programadora e Professora Associada na Universidade Sorbonne Nouvelle, onde concluiu o seu doutoramento em Estudos Cinematográficos em 2015. Publicou a obra El Autorretrato en el Documental. Foi bolseira de pós-doutoramento da FCT no CEC/Universidade de Lisboa, no IHC/Universidade Nova de Lisboa e na Universidade do Western Cape. É co-editora da revista de teoria e história do cinema La Furia Umana e conselheira de programação do International Film Festival Rotterdam (IDFA). No Hangar — Centro de Investigação Artística, programou, entre outros eventos, o ciclo Seeing Being Seen: Territórios, Fronteiras, Circulações (2020-2022).